A 19 de Março assinalam-se duas datas comemorativas: o Dia do Pai e o Dia Mundial do Artesão. Para celebrar ambas, destacamos várias formas de arte características do Porto e Norte de Portugal, que são legadas de geração em geração, de pai para filho/a.
Em homenagem a todos os pais e a todas as formas de arte tradicionais que marcam a autenticidade da nossa região, convidamo-lo a percorrer um roteiro no qual irá descobrir várias artes e ofícios tradicionais e únicos, que marcam gerações, traços identitários e a memória coletiva da nossa região.
O Barro Preto de Bisalhães é uma arte considerada Património Cultural Imaterial da UNESCO, desde 2016.
Esta arte é um processo bastante antigo, com características muito peculiares e próprias da aldeia de Bisalhães, tendo passado de geração em geração. Os oleiros da aldeia ensinaram aos seus filhos as técnicas e processos que uma peça de barro preto exige e, os quais, remontam ao século XVI. Tudo começa com o tratamento inicial do barro até à cozedura. As peças nascem pelas mãos dos artesãos, são cozidas em fornos velhinhos abertos na terra, onde são queimadas giestas, caruma, carquejas para, de seguida, serem cobertas com terra escura a qual lhe confere a típica cor negra.
Hoje, esta arte continua a ser praticada pelos oleiros antigos que tentam passar o seu legado aos mais novos e não deixar este Património da UNESCO perder-se no tempo.
Em Moimenta da Beira, há uma arte que tem passado de geração em geração à várias décadas: a cestaria de palha e silva.
Joaquim Silva aprendeu a fazer cestos de palha e silva com o pai, para utilizarem na agricultura desde a sementeira aos adubos. Ele e os irmãos não seguiram os passos do pai, tendo colocado de parte a arte da cestaria por outras vertentes profissionais. Mas, há cerca de 10 anos, Joaquim sentiu o desejo de voltar a criar peças com a arte que o seu pai lhe ensinou há tantas anos atrás.
E afirma que o continua a fazer para que esta arte não se perca no tempo e permaneça viva na sua terra natal.
Perto da Aldeia de Ariz, em Moimenta da Beira existe um lugar isolado que ainda não foi descoberto pela corrente eléctrica. Aqui habita Augusto Ferreira, com a sua esposa numa casa por cima do moinho, no qual trabalha diariamente.
Nos finais dos anos cinquenta, os pais de Augusto compraram os moinhos e os terrenos circundantes, tendo Augusto aprendido a arte do moinho com os seus progenitores.
Conhecia todos os moinhos da zona, desde Fráguas até Ariz. Hoje, a maior parte está em ruínas e, embora alguns ainda estejam completos, já não funcionam. Aptos para a moagem, só existem dois – o dele e um em Peva, que ajudou a pôr a funcionar. Conhece os engenhos peça por peça e basta-lhe olhar para a mó a girar para perceber se a água que passa é suficiente, se as penas do rodízio estão todas em ordem ou se há alguma cunha que precise de ser apertada.
Do moinho, consegue a farinha para cozer, na lareira, várias iguarias como broa de milho.
A oficina de Arte Sacra de Fânzeres é das poucas oficinas existentes na atualidade em Portugal a produzir arte sacra. A oficina foi fundada por José Neves, que aprendeu o ofício da talha com o irmão, especializando-se na execução de esculturas, saber-fazer que transmitiu aos filhos Hugo e Tiago Neves. A oficina incorpora vários ofícios tradicionais possuindo nos seus quadros artesãos experientes e especializados, entre entalhadores, marceneiros, pintores e polidores.
Os principais serviços são a produção de esculturas à escala e o restauro de igrejas completas, gozando de grande reputação nacional e internacional nesta temática.
A partir da segunda metade do século XIX até aos anos ’70 do século XX, o Concelho de Gondomar era reconhecido pela qualidade dos seus marceneiros e oficios similares, existindo no território um grande número de oficinas dedicadas a esta arte.
Há, no Muro dos Bacalhoeiros, em plena Ribeira, uma oficina de construção de barcos miniatura. Chama-se Barcos Naná, porque assim é conhecido pelos amigos o artesão que lhes dá vida, de seu nome Fernando Teixeira. A arte está na família há três gerações. Começou com o avô, que passou o legado ao seu pai, que por sua vez, ensinou, a mestria ao senhor Naná, que se dedica com empenho e paixão à construção de barcos rabelos em miniatura.
É um dos locais mais visitados na Ribeira, quer pela localização, com vista panorâmica sobre o rio Douro, e sobre os barcos Rabelos, quer pelo caráter genuíno do espaço e do artesão. É um ponto de paragem obrigatório na cidade invicta.
A Oficina do Alfredo é um projeto familiar. Preservar os conhecimentos do mais velho, o Alfredo, mestre no restauro de antiguidades, juntar-lhe inspiração e utilizando matérias-primas locais, ou reciclando madeiras de mobiliário para criar brinquedos de forma artesanal, são os pilares desta oficina
A empresa SÓ-OURO é uma empresa de cariz familiar com grande ligação à cidade de Gondomar, Capital da Ourivesaria. Fundada em 1987, encontra-se há mais de 30 anos no seio da família Moura, atualmente é um jovem, Arlindo Moura que perpetua o saber-fazer adquirido ao longo de 6 gerações de ourives. Na oficina tradicional do seu avó paterno, cria todo o tipo de peças, com especial foco nas peças únicas, feitas à medida de cada cliente, utilizando as técnicas ancestrais para conceber peças de design contemporâneo.
A empresa integra a Rota da Filigrana. Poderá descobrir mais sobre esta arte ao explorar a Rota, ficando a conhecer a produção artesanal da filigrana através de visitas às oficinas (as quais são gratuitas), visita à Casa Branca de Gramido e ainda um workshop no Centro de Formação Profissional da Indústria de Ourivesaria e Relojoaria.
Em Espinho, uma das suas mais importantes e mais valiosas artes são os Violinos Capela.
A casa, na freguesia de Anta, conheceu as três gerações da família Capela, onde os instrumentos ganham vida, sobretudo os violinos, com fama à escala mundial. Os luthiers Capela, constroem e reparam violinos, violoncelos e violas de arco, tudo feito à mão.
Em 1924, o jovem marceneiro Domingos Capela consertou um violino de um músico italiano que atuava num dos casinos de Espinho. Outros consertos se seguiram, até que conheceu a violoncelista Guilhermina Suggia, que o convidou para trabalhar no Conservatório de Música do Porto. A partir daí, nunca mais deixou de construir instrumentos de cordas, sempre na sua oficina perto do Largo da Igreja da Anta, onde os seus herdeiros ainda hoje trabalham. Faleceu em 1976, mas um dos seus filhos, António Capela, tinha já, garantido a continuidade da arte, através de formação no exterior, nomeadamente em Paris e Cremosa, berço dos grandes luthiers. Participou em vários concursos de construção de violinos, ganhou diversos prémios, tendo o seu maior êxito sido alcançado em 1972, em Poznan, na Polónia, quando concorreu, juntamente com o pai, com quatro violinos que alcançaram os quatro primeiros lugares. Seguindo as pisadas do pai, foi também ele reconhecido internacionalmente.
Hoje, é o seu filho, Joaquim Capela, a fazer o mesmo. Construiu o seu primeiro violino aos 13 anos e, pouco depois, participou no seu primeiro concurso internacional. Estudou nos EUA, e também ele tem alcançado vários prémios em concursos internacionais, mantendo uma tradição familiar que já vai na terceira geração.
Foi no Lugar da Lagoa junto à EN13, em Esposende, onde tudo começou outrora. É precisamente na proximidade desse local, que atualmente Manuel Fernando Morgado Neto detém o seu atelier de trabalho. Pai, Filho e Artesão desde à longa data, é artista na arte de trabalhar sobretudo a pedra. Esta arte característica de Esposende, consiste na transformação do granito em obras de arte como por exemplo, esculturas.
Aprendeu esta arte junto das suas raízes familiares, onde refere a influência dos seus tios Franklim Vilas Boas e António Vilas Boas, destacando a figura do seu Pai e grande mentor Quintino Vilas Boas Neto, cujo legado mantém vivo, com a resiliência e a disciplina incutidas pelo seu progenitor. As obras de Quintino Vilas Boas Neto estão presentes em vários lugares, podendo ficar a conhecer algumas no Museu Municipal de Esposende.
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O Figurado de Barcelos é, hoje, uma produção artesanal certificada. A sua história e produção marcam a cidade de Barcelos, bem como as suas famílias, estando representado em várias oficinas familiares da cidade. Um deles é Fernando “Baraça”, filho da nobre artesã Ana Baraça. Desde tenra idade aprendeu o ofício de trabalhar o barro, com a mãe e com o avô que era oleiro. A paixão pelo barro e pela arte foram suficientes motivações para dedicar uma vida inteira à produção de Figurado de Barcelos.
Este gosto, passou-o naturalmente, para os seus filhos Vítor e Moisés, que também eles, desde crianças, escolheram o artesanato como profissão, não imaginando a vida de uma outra forma. A criatividade artística é o que lhes vai na alma e no coração.
Barcelos é, sem dúvida, um lugar dedicado ao artesanato. Uma das várias artes praticadas é a cestaria, quer com cariz utilitário sendo os cestos utilizados para as tradicionais lides da agricultura, quer com um sentido criativo de decoração, como são exemplos os abanadores e abanicos.
Abílo da Costa Pereira aprendeu a fazer “gigos” para trabalhar na terra quando tinha 14 anos. Mas foi aos 28 anos que se dedicou profissionalmente à cestaria. A arte de entrelaçar fibras vegetais deixou de ter segredos para Abílio Pereira, que com um talento natural e muita dedicação, tornou-se a sua grande paixão. As suas capacidades técnicas e a criatividade inata promoveram o carácter inovador das suas peças, adaptando-se sempre às tendências do mercado. O seu percurso profissional é acompanhado, igualmente, pela aptidão de Abílio dos Anjos Pereira, o único de seis filhos que decidiu, orgulhosamente, seguir o caminho do pai.
Convidamo-lo a conhecer e explorar a Rota do Vime e da Cestaria, em Barcelos para conhecer ainda melhor não só esta arte, mas também os pais e filhos que nela trabalham.
Outra arte em família típica de Barcelos é o fabrico de louça preta.
Júlio Alonso, hoje com 92 anos, cresceu no seio de uma família de oleiros dedicada ao fabrico de louça preta. Aos 8 anos já fazia púcaros, pelo que fez da “roda” a “arte” da sua vida. Foi um dos mestres mais conhecidos nesta arte no Minho, tendo sido distinguido em várias feiras e exposições. Notabilizou-se por adaptar às técnicas ancestrais de fazer louça preta a tradição de Figurado de Barcelos. O seu filho João Alonso segue as passadas do pai, dedicando-se também ele à produção de louça preta figurativa, dando assim continuidade à obra e arte de Júlio Alonso.
A Filigrana é a herança cultural imaterial que melhor simboliza a identidade da Póvoa de Lanhoso.
Esta arte milenar percorreu um longo caminho até ao aperfeiçoamento da técnica, alcançando belíssimas obra de arte. Esta mestria radica na transmissão do conhecimento empírico de pais para os filhos, perpetuando-se uma ligação umbilical entre ambos, replicada no entrelaçar dos fios de ouro ou prata.
A feitura de instrumentos musicais de percussão, tais como a “caixa” e o bombo, é também uma atividade com bastante tradição em Guimarães, sobretudo dedicada às Festividade em honra de S. Nicolau (Nicolinas). Existem ainda artesãos que se dedicam à feitura deste tipo de instrumentos musicais, cujo legado lhes foi transmitido geracionalmente, como são exemplo José Manuel Alves e José Salgado Alves.
Créditos fotográficos: Paulo Pacheco CMGuimarães
Em Trás-os-Montes, os muitos rituais com máscara, enraizados no neolítico, aprofundaram-se com as ancestrais sociedades agro-pastoris pré-romanas e chegaram até nós através das sociedades camponesas medievais, percorrendo um caminho que já atravessou mais de três milénios, marcando a cultura transmontana de forma muito forte e diferenciada.
Quer o segredo da liturgia dos rituais, quer a perpetuação da arte de esculpir as máscaras, passa de pais para filhos, tal uma cadeia transmissora que não pode quebrar-se. No concelho de Vinhais, na aldeia de Vila Boa, constituem exemplo Tozé Vale que herdou a arte de seu pai e a transmitiu a seu filho Edson Vale, desde 2000. Já na aldeia de Pinela, em Bragança poderá encontrar Manuel Alves Rodrigues a esculpir as máscaras típicas, artes que herdou do seu pai e legou ao seu filho Alex Alves Rodrigues.
O talento de forjar o aço, a arte do corte perfeito das navalhas MAM da aldeia de Palaçoulo, concelho de Miranda do Douro, tem passado ao longo de várias gerações de pais para filhos.
José Afonso Martins com 75 anos legou a arte ao seu filho, Altino Martins. Atualmente com 64 anos, Altino já transmitiu o seu saber artístico aos seus filhos Hugo Martins e Hélio Martins.
Um outro exemplo conhecido na região de produção desta arte é a empresa, que apesar do seu crescimento, se mantém familiar: a Filmam. Esta empresa produz canivetes há 150 anos, com um volume de cerca de 7 milhões. O modelo principal de produção tem o nome de Palaçoula em homenagem à aldeia onde esta arte nasceu e tem lugar.